sábado

Amor escolhido



encontrei-te brinde à alegria
encantaste a tarte escarlate
encarnaste a translúcida taça de vinho
tempero d’alma
corpo moreno de sol a louro de lua

quando acariciei o cabelo em trança
- que deixaste para mim anelado de anjo
ergueste o ombro e eriçaste o alvo e longo lombo
abrindo lindo sorriso de criança

sonho
na ponta dos dedos

(há quem escolha não viver um amor
mas não há como escolher não amar)


  


domingo

Tu és dentro



teu sim
é tua arte
- palavra
  em si
  nua

é amor a permitir-se melhor
a insinuar-te
cravando intenso martelo
pingando em teu rosto meu suor
minha poesia

entrei forte
chicote de domador sobre o pelo
que arrepia

(só dista o que se adia)

- teu corpo belo
  bebo hoje num longo gole de uva tardia

tu  
tu és dentro
o meu tempo
a sentir saudade 
e amar em liberdade
amar em liberdade


  

sábado

Macerado coração

colhi para ti
a melhor safra
as mais vivas uvas
de brilho carmesim
- doce madureza em macias texturas

e mesmo assim
rente entrenós
podaste-me
jogaste-me ao chão
às secas ramas em ruína 

não bastasse
como espelho que finge
maceraste-me
apagando às lágrimas a pruína do coração
- com desdém no espezinho

dói pedra o tropeço na ilusão
mas não adstringe

fortifica o vinho

  

domingo

Amor, doce gole

vento de salina desértica nos olhos
com avidez de alma em sequidão
- há muito o amor se fez descolorir
  deixou de respirar vida

mas ele é surpreendente bebida
irriga a si próprio
brota longa haste de qualquer chão
faz sorrir ácidos lábios
ergue-se irrompendo a mais biliar solidão

dança dunas áridas
arromba grades
picha muros
sobe pelas paredes


quando menos se espera
nos acorda
suavemente 
ao dorso se lança
exalando aromas amorosos
lacrimejando sutis prazeres
e de sangue tinge a borda

que melhor palavra escreveria na tua boca
 a derramar-se adentro já no primeiro gole de vinho?

teu nome, meu amor

meu docinho

  

Nefasto



                 esquecido na cinza tarde
            - fragor de chuva de granizo
em corpo de raio o medo escondo
                                                                                                     
o belo anjo veio fera
               brindou sangue
                                 hediondo

agora sei
a morte foi menina sim
brincou comigo de não saber quem era

ah
nem se zangue

já não estranha mais o silêncio seguido de estrondo